segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Imortalidade

Sabe uma coisa, Jorge?

Já não me interessa a angústia por que passámos durante o nosso caminho.

Interessa-me lá recordar as nossas algumas discussões, a diferença de pontos de vista, as formas de estar divergentes, o pouco tempo que estávamos juntos porque, entre gestão, consultas, cirurgias e filhos, não tinha disponibilidade.

Lembro a sintonia, a cumplicidade profunda que bastava um olhar, as gargalhadas, as conversas sem fim, as centenas de sms, as palavras inventadas, a necessidade de estarmos de mãos dadas ou de braços encostados porque o toque ainda nos aproximava mais.

Estávamos condenados à separação. Não havia outra escolha, outra direcção a tomar. No início, não percebeu por que fui, e eu não percebi por que me deixou ir.

A mágoa tomou outro rumo. Compreendi-o quando, meses depois, me apeteceu telefonar-lhe e a nossa conversa foi leve, sorridente, plena e cheia de amizade. Fiquei em paz.

Quando nos encontramos, em palestras ou congressos, caímos um no outro num abraço só nosso. Esteja quem estiver à nossa volta. Conhecido como um sedutor, com fama e proveito, as pessoas provavelmente pensarão que fui mais uma das suas pombinhas. Tão enganadas... Fomos muito mais: homem e mulher, duas crianças, cujas almas se tocaram num amor platónico.

A ternura inexplicável que sentimos afoga-nos de alegria quando nos vemos.

(Apenas senti esta doçura com o meu ex-marido, um ano depois de termos terminado o casamento. Foram necessários quase sete anos para perceber que era um sentimento só de ida. Deixei-o partir e, quando nos encontramos, parecemos somente colegas sem passado comum.)

Não se lembra do meu aniversário. É normal. Mas nunca se esquece de mim em datas assinaladas.

Não consigo, não consigo mesmo explicar o que sinto quando demonstra a sua presença e preocupação e oferta de ajuda quando sabe (ou lhe dizem) que não estou bem. Aconteceu em várias alturas. Mas a que mais me deixou em lágrimas interiores foi o seu telefonema quando saí da ARS. Não perguntou nada. Mas pôs-se à minha total disposição, com companheirismo e afeição.

Quantas vezes sinto que não aguento mais? Conheci e conheço tanto logro… Provoca-me uma decepção e tristeza que me oprimem. Consigo foi ao contrário e caso raro. Primeiro conheci o seu lado lunar, depois, muito mais tarde, o aspecto solar.

Nestes momentos, nestas alturas em que me sinto naufragar, agarro-me a si e a boas memórias para continuar a rir e a sobreviver.

Acredito na imortalidade, Jorge. Não apenas na vida após a morte. Mas também na dos sentimentos. Uma crença partilhada por si. Os dois temos a certeza de que este carinho nunca terá fim.

Se a ordem natural das coisas suceder, garanto-lhe o meu desejo de que, no limbo ou seja onde for, num lugar qualquer sem tempo nem espaço, me dê a sua mão e me acolha com o seu sorriso.

Levarei toda a minha meiguice estrelar para lhe oferecer.

6 comentários:

Bartolomeu disse...

Ainda ha quem opine que as cartas de amor se extinguiram para sempre... pfhh.
Ah grande Jorge, podes ser um grande caçador de pombas, mas outra como esta... duvido que tenhas pontaria para alvejar...
;)
Fixe, virgulosa vírgula!

Vírgula disse...

;))))

Obrigada, Bartolomeu!

Abraço.

Ponto de Interrogação disse...

Concordo em pleno com o que disseste, Bartolomeu, com a diferença que, no entanto, tenho a certeza que Vírgulas como esta só há uma: a 'nossa' Vírgula e mais nenhuma :)

Vírgula disse...

Éta, lélé. Exagero em acção...

Ponto de Interrogação disse...

Ó Birgulazita, alguém lhe preguntoue alguma cousa? Hein? Hum!

És e ponto final!!! Parágrafo - que fica sempre bem neste blogue... :)

***

Vírgula disse...

Mas que ganda P...onto de Exclamação!

'Tou à beira da tromb...ose... :))

Ti...chau. Sem tempo pa brincar!