domingo, 12 de setembro de 2010

A porta do cavalo


Sou extraordinariamente reflexiva. Começo a divagar pela mente e, na maior parte das vezes, deparo-me com encruzilhadas. Quando olho para trás, o caminho já é outro. Sinto-me perdida.

Para mim, a maior riqueza que o homem pode ter é o conhecimento. Mas o que e como fazer uso dele? Há quem diga que o transportamos nos genes. Que uma parte de cada um de nós carrega consigo os nossos antepassados e mais: a resposta à pergunta 'como, de onde e porque viemos?'

Eu acredito. Senão nesta, noutras teorias cuja génese é similar.

Por vezes não consigo deixar de pensar que a vida ou a nossa existência, tal como a conhecemos, é demasiado injusta e que, por outro lado, pouco fazemos por merecer as potencialidades que existem em cada um de nós. Somos extraordinariamente egoístas.

Acho que o ser humano é capaz dos actos mais atrozes que facilmente destronam a animalidade existente em qualquer outro ser alegadamente irracional, mas sou suficientemente crédula para me permitir pensar que, nos antípodas, somos capazes de sintonizar perfeitamente com a natureza inventando formas de estarmos mais próximos e, consequentemente, mais harmonizados. Qual é, então, o nosso problema?

Na minha opinião, é o facto de nascermos condicionados. Não que os outros seres não o estejam ou sejam, por razões naturais, mas aceitam-no sem qualquer tipo de evasivas. Dificilmente um cão se renega por ter menos uma pata. Aceita a circunstância e sobrevive de acordo com ela.

Nós somos condicionados a partir do momento em que nascemos. Ensinam-nos que a liberdade se conquista, assim como o respeito, o amor-próprio, a vida. Aquela que apenas a cada um de nós pertence. Mas colocam-nos, desde logo, uma série de requisitos que temos de cumprir criteriosa e exaustivamente. Quando damos por nós, já nos esquecemos que, em tempos, existimos, e de como éramos nessa altura.

No fundo, não estamos a crescer. Estamos apenas a aprender a amarrar-nos à ilusão de que, com um pouco de sorte, teremos uma vida fácil, com um companheiro que nos veja, oiça, com quem quereremos dividir a nossa existência numa vivência genuína e recíproca. Com isto, acabamos por condicionar o nosso estar com os outros.

Eu acho que o ser humano é sobrevalorizado, mas também subvalorizado. Não há meios termos.

Há tempos, dizia à minha melhor Amiga - a Vírgula - que, para mim, a vida é como uma moeda. Uma das faces representa o bom da vida. A outra, o mau mas que contribui, muitas vezes, para alcançar uma maior maturidade na forma como, de futuro, enfrentaremos situações semelhantes. Mas existe o meio termo. Sabem quando a moeda cai de pé no chão? Nem caras, nem coroas. Para mim, é o meio termo. É assim que vejo a vida.

Com tudo o que nos persegue, é difícil, senão quase impossível, encontrar um meio termo. Carregamos connosco múltiplas características que contribuem para uma espécie de auto-ostracismo. Tendemos a esconder-nos de nós próprios. Tudo, devido aos traumas, vivências e experiências que vamos colhendo silenciosamente e que, de forma ilusória, nos entram pela porta do cavalo, e se escondem minuciosamente à espera da deixa que as fará entrar em cena. Com alguma sorte, as deixas são substituídas por outras e as personagens vão mudando. Mas quando a solidão se instala, a insegurança toma conta de nós e a esperança parece nem conhecer-nos, dá vontade de pura e simplesmente, apagar a luz. Blackout total!

Considero-me uma pessoa humilde e suficientemente objectiva para o reconhecer. Não tenho problemas em pedir desculpa, quando percebo que errei. Ainda que mo façam ver. Magoa-me que, por vezes, esse acto não seja tido em conta. E não deixo de pensar se esse não será um padrão que todos nós repetimos uns entre outros à semelhança de outros acontecimentos nas nossas vidas e que podem marcar-nos de forma inconsciente mas terrivelmente condicionadora. Esses são, para mim, os subterfúgios da porta do cavalo que existe em cada um de nós. O problema, é que eles entram para dificilmente voltarem a sair.

Acredito na alquimia dos sentimentos e das emoções. Mas ainda não aprendi, nem sei se alguma vez o conseguirei. Para já, desejo que as minhas angústias, os meus medos, as impaciências que me assolam de quando em vez, entrem directamente pela porta da frente para eu poder indicar-lhes, diplomaticamente, a saída.

Há gente que amo demasiadamente, para correr o risco de me levar a cometer o acto extremo de lhes provar que, conhecerem-me e terem-me foi, de alguma forma, o pior que lhes aconteceu. Não quero voltar a senti-lo.

Por isso mesmo, e a partir de hoje, acabou-se a porta do cavalo. Agora, só quando me permitirem entrar em espectáculos sem pagar. Quem sabe se um dia não será um espectáculo só meu...

4 comentários:

Anónimo disse...

Também a este post serei a primeira a fazer um comentário. E sinceramente não sei o que dizer.

A maneira como exprimes os sentimentos que te invadem, inibe-me de fazer grandes comentários.Só gostava que não te sentisses assim.
Que podemos nós fazer? Como ir ao encontro do que desejas e pretendes?
Estás completamente errada quando dizes que conhecerem-te foi o pior que aconteceu. Se te conheceram bem,e fizerem uma rectrospectiva pensarão o contrário. Conhecerem-te foi o melhor que lhes podia ter acontecido, pois não há muitas pessoas como tu.Amiga do seu amigo, confiante, sempre pronta a ajudar em tudo em detrimento de ti própria. Terem-te... Foi o melhor que lhes podia ter acontecido.
Quanto ao resto... O resto tem a ver com a sociedade em que nos integramos e que por mais que façamos ou tentemos não vai mudar nos séculos mais próximos.

Um dia virá em que seremos todos iguais. Homens, Mulheres e Animais. Só que nessa altura já cá não estaremos. E tal como dizes, a vida é um meio termo. Um lado bom e outro mau. Há que sabermos adaptar-nos e ultrapassar o mau.
Nâo posso dizer mais nada, pois não sei que dizer.
Talvez devas de vez em quando rasgar as convenções e fazeres prevalecer o que desejas e queres.
Acho que ainda não assimilei o teu desejo de vivência e sinto-me culpada por isso. Ajuda-me a entender e a ajudar-te também.

Bartolomeu disse...

Se a verdade nunca deixar e habitar no teu coração e nos teus lábios... as "portas do cavalo" não farão qualquer sentido na tua vida.
Não será mais justo, pagar por cada espectáculo, o preço que ele valer?
;)

Ponto de Interrogação disse...

Vocês podem fazer o que sempre têm feito: o melhor que sabem e podem.

Estes 'sentimentos' são de mim para mim e só há uma única pessoa no mundo à altura de os enfrentar, ultrapassar e resolver: EU!

Uma das formas de o fazer é verbalizar o que sinto. Desabafar. Este blogue é um espaço sagrado que tem permitido exorcizar algumas coisas.

Eu não disse que o pior que aconteceu foi conhecerem-me. Simplesmente há momentos em que os meus comportamentos me levam a ter receio disso. De estar a mais, de fazer mal aos de quem mais gosto e vocês estão incluídos, como é óbvio. Mas depois, consigo racionalizar.

Quanto ao resto, de facto é o que sinto cada vez mais necessidade de fazer e, (muito) devagarinho vou conseguindo 'rasgar as convenções e fazer prevalecer o que desejo e quero'. O meu desejo de vivência também tem a ver com isto e, a seu tempo e em circunstâncias diferentes, não tenho dúvidas de concretizará.

Mais beijinhos!!!

Ponto de Interrogação disse...

Olá Bartolomeuzito!

Desaparecido em combate? :)

Olha, com'os meus neurónios andam um cadito cansaditos, peço-te que me desculpes, mas num pecebi patavina do que escreveste. Mas agradeço-te...

;)