quarta-feira, 2 de junho de 2010

Riso partilhado 4

Admito. Por vezes sou uma filha de Eva insuportável. Sinto e vivo as situações dos que amo tanto ou mais do que se fossem minhas.

Foi convidado para um programa de televisão. Longe de ser uma estreia, estava calmo e descontraído. Para mim, um desassossego.

Único pedido que me fez: que lhe escolhesse a roupa. No próprio dia, fui cedo a casa dele. Meti o nariz nos roupeiros, enquanto fatos, camisas e gravatas saíam disparados para cima de qualquer coisa que estivesse à mão.

Etapa vencida, passei às recomendações. Mil e uma. “Não te esqueças de pôr a gravata”. “Olha assim e não assado”. “Não te agarres a bengalas”. “E, por favor, aperta os punhos da camisa!”.

- Está descansada.

- Não, não estou. Já sei que vais chegar atrasado e que te vais esquecer de arranjar a camisa.

Riu-se, pôs-me as mãos nos ombros e empurrou-me até à porta.

- Quero um beijo! – disse-me.

Esperou que eu entrasse no elevador com um “vou dando notícias!”.

À hora, lá estava eu frente à televisão.

Primeiro plano, primeira intervenção. Sendo uma obra da natureza (quase) perfeita, não é nada telegénico. Não faz mal. O que diz e como diz cativa.

“Não posso acreditar”, pensei, “punhos desapertados e o relógio a baloiçar no braço…”

Segundo plano, segunda intervenção. Menino crescido e arranjado. Conheço bem as expressões e percebi um esgar ligeiramente sorridente, tipo “haha, julgavas que me apanhavas!?”.

Dei uma gargalhada forte e sonora. Imaginei-o a arranjar-se enquanto as câmaras focavam os outros dois convidados e a jornalista.

- Então, miúda, o que achaste? – perguntou-me ao telemóvel. Ainda não tinha saído dos estúdios.

- Ai, patrão, patrão, o menino não tem juízo nenhum…

Começou a rir.

- Cheguei atrasado…

Eu, fanática com as horas, teria caído com um enfarte fulminante. Quantas vezes o levei a reboque…!? Até que parei e pensei: “mas o que é isto? Diferente de mim, só tenho que aceitar”. Faço tudo para eliminar o stress. Chegar tarde um minuto que seja põe-me a transpirar copiosamente. Mas não podia preocupar-me porque, para ele, não constituía problema.

Hesitei. Pouco tempo. Muito pouco, mesmo.

O resto do telefonema foi preenchido com gargalhadas, episódios sobre o desregramento dele e palavras de amor.


2 comentários:

Anónimo disse...

Todos estes risos me fizeram sorrir.

Leves, carinhosos, criando a vontade de mais e

mais. Parabéns e aguardo continuação.

Um beijo "Mana".

Vírgula disse...

Muito obrigada, querida Mana! :-))
E o silêncio de quem tanto para contar? Hein? Vamos acabar com ele?
Beeeeeiiiiiiijo!!!