terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Paz ou o processo de pacificação…


Estou a passar por uma das muitas crises existenciais que como seres humanos vivenciamos. Arrisco até dizer que se trata de uma questão filosófica.

Afinal o que é que nós, como seres humanos, pretendemos atingir verdadeiramente? Sucesso? Poder? Liquidez financeira? Uma casa; um carro? Descendência? Amor? Atenção? Paz? PAZ! Este é um conceito que é geralmente definido como um estado de calma ou tranquilidade. Uma ausência de perturbações ou agitação. Deriva do latim Pacem que significa Absentia Belli – ausência de violência ou guerra.

Primeira questão: a minha eterna ou vasta gama de conceitos. Violência pode significar tanta coisa ou a mesma coisa mas em contextos diferentes. Há vidas, existências, vivências violentas. Violentas de carência; de angústia; de tristeza e afins; ou apenas violentas na mais crua acepção da palavra. O mesmo posso dizer do conceito de guerra: as batalhas que travamos diariamente num panorama por vezes abstracto, outras definido pelos nossos problemas e condicionantes criadas - quiça – pela violência diversa a que estamos sujeitos. No fundo, talvez não seja errado dizer que é sobretudo connosco que estamos em guerra e violência permanentes.

O que eu acho é que, independentemente de tudo o que pensamos ou sabemos procurar, há algo que, no fim da estrada, ultrapassados inúmeros obstáculos e tatuadas na pele, no sangue e na alma cicatrizes da experiência que é viver, cansados desejamos apenas uma coisa: a pacificação do nosso eu perante o mundo e nós próprios.

Segunda questão: porque é que o fazemos? Porquê? Porque é que passamos por tanto para encontrar algo que, afinal, está dentro de nós? 

Ultimamente insisto na teoria ou constatação - (eu e os conceitos) – de que o que nos estraga como seres humanos é a única característica que defendemos orgulhosamente distinguir-nos de todos os outros seres: a racionalidade. Pois cá para mim, e perdoem-me a fraseologia, mas a racionalidade é uma grandecíssima merda! É o que nos faz sofrer. Não experimentem isto em casa mas na vossa fértil imaginação construam este quadro: atropelem um homem e um cão e verão qual se queixará mais, qual se debaterá mais para sobreviver apenas e só com as suas próprias capacidades; qual será o ser que se resigna e o que aceita. A resignação tem implícito um sofrimento calado e submisso. A aceitação é um estado de aprendizagem aliada ao mais puro e natural dos instintos: aquele que a racionalidade nos roubou.

Terceira e última questão cuja resposta ando à procura: porque é que precisamos de nos pacificar se nascemos puros e genuínos? Não deveria a nossa existência basear-se apenas nos mais altos valores, princípios e ideais que sustentam o conceito universal da condição humana? Já alguma vez pensaram que se a Eva não se tem permitido seduzir, ainda por cima por uma serpente, nunca teria comido a porra da maçã, analogia curiosa para a racionalidade de todos os tempos, nós – os seus descendentes – seríamos muitíssimo mais felizes? Estúpidos, mas felizes! Ou, melhor dizendo, inteligentes, irracionais e felizes! Neste caso somos apenas inteligentes mas a racionalidade provoca uma monção geral seguida de curto-circuitos dignos de quebra-cabeças difíceis de solucionar. Perdemos tempo a pôr as ideias no lugar porque a maldita da racionalidade nos massacra e nos convence a termos pena de nós próprios como se nada mais existisse.

Acredito, por isso, que o processo de pacificação passa por um desvinculo a esse sentimento amoral, que nos rouba de nós próprios e que nos manipula a ponto de sentirmos que somos incapazes de viver sem ele.

Concebo que as mais difíceis vicissitudes da vida nos despertam para isso e que a paz pela qual tanto ansiamos sem sabermos porquê, visa valorizarmos o que é verdadeiramente de primordial importância. 

Só assim sou capaz de compreender o sofrimento a que todos estamos sujeitos em determinada(s) fase(s) da vida. Ele prepara-nos para a única coisa inevitável: a morte ou como queiram chamar-lhe. Acredito que alguém que durante este processo não consegue encontrar a paz até ao “fim” é porque nunca viveu. 

A minha mais recente experiência leva-me a acreditar que a única forma de lidar com o sofrimento, a tristeza, a angústia, a violência, a guerra, a expropriação de nós próprios, é através desse processo de pacificação quase inatingível mas, ainda assim, possível. Não quero com isto dizer que não nos zanguemos ou exasperemos. Apenas que, flamejadas essas cicatrizes, aceitemos que a vida em si é um caminho árduo mas que carrega consigo o vínculo de um ciclo constante e renovador.

Como as ondas do mar que vão e vêm e tornam a ir, a nossa existência consubstancia uma mudança, limpeza e reciclagem permanentes que, no fim, nos relegam para um único caminho: a Paz da nossa essência.

1 comentário:

Anónimo disse...


Lindo !... Este comentário é mais uma demonstração da tua sensibilidade. A pacificação de que falas é de facto quase inatingivel, pois isso pressupõe o desligamento e a desistencia de muita coisa material. É quase como, julgo eu, na minha ignorancia, aderir à religião tibetana e viver como vivem os monges do Tibete. Na sociedade em que estamos inseridos, será isso possivel? Julgo que não, pois isso não está enraizado em nós. Teriamos de morrer e voltar a nascer para podermos começar do zero.
Bendita sejas por pensares assim. Talvez para ti seja mais fácil a pacificação.

Será ???
Um beijo grande